domingo, 29 de janeiro de 2012

Alberto

Um dia, de mansinho, olhei pela janela
o vi chegar na casa ao lado.

Um completo apaixonado pela moça
de cabelos alaranjados e bochechas sardentas.

Trazia-lhe flores com cheiro de amor
Bombons com sabor de desejo
Bilhetes recheados de palavras doces e bonitas...

E eu sempre ali, no mesmo horário a espiar

Um dia as horas de seu relógio adiantaram-se de propósito
Como? Não sabe-se!

Cedo chegou e a viu em outros braços
Mas não eram braços peludos, ou tinha barba mal feita
Eram braços dourados, e lábios com batom de cereja

Agora tudo fazia sentido

As flores murchavam, os bombons venciam e os bilhetes partidos ao meio.

Nunca fora correspondido
Não por falta de romance

Apenas por não ser Juliana,
E sim um tal Alberto homem.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Aparento

Não sou, mas hoje estou!

Pareço-me tão velha quanto o mundo

As jóias já não me iludem

O pranto não desce

A vida, hoje, desaparece...

E estou morta!

Fecho os olhos, apago

Tudo morre,

E sobrevivo...

Acordando me vejo jovem

E viva

Ainda respiro

Coração bate

E as horas vão passando...

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Corridinho

Adélia Prado

O amor quer abraçar e não pode.

A multidão em volta,

com seus olhos cediços,

põe caco de vidro no muro

para o amor desistir.

O amor usa o correio,

o correio trapaceia,

a carta não chega,

o amor fica sem saber se é ou não é.

O amor pega o cavalo,

desembarca do trem,

chega na porta cansado

de tanto caminhar a pé.

Fala a palavra açucena,

pede água, bebe café,

dorme na sua presença,

chupa bala de hortelã.

Tudo manha, truque, engenho:

é descuidar, o amor te pega,

te come, te molha todo.

Mas água o amor não é.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Gosto de gostar do gostar.


O que é pior, tenho muitos,

com a capacidade de serem amores

mas o antigo não me deixa querer

não me deixa viver

e eu gosto de sentir

de curtir

de fugir

gosto do passado

que durou trezentos e sessenta e cinco dias

gosto do estado de gostar do coração quebrado

do rompido e lúcido órgão do depósito de amores

e aos rumores verdadeiros: um adeus.